Apanhámos uma trovoada de Verão na ida, e quando chegámos ao ponto de acesso para a parte mais alta da montanha ainda chuviscava, e o tempo estava demasiado incerto para arriscarmos a subida. Acabámos por jantar no parque de estacionamento, entre caravanistas e outras pessoas com as mesas e cadeiras de campismo montadas ao lado do carro, todos nós adiando o inevitável regresso à cidade. Ele sentou-se na cadeira desmontável; eu como sempre prefiro o chão (em tantas coisas), e estendi a minha manta no alcatrão. Encostei-me às cordas que passam pelos pilaretes de cimento, delimitando a zona de estacionamento, e fiquei de frente para a encosta muito verde da montanha, aquele prado bonito que antecede a floresta de pinheiros muito altos e direitos que sobe até ao planalto de quase-tundra no topo.
Foi a primeira vez em dois meses que vimos o termómetro do carro descer abaixo dos trinta - foi só preciso esperar pelas oito da noite a mil e oitocentos metros de altitude, depois uma chuvada. Ainda se sentia o fresco na pele, ouviam-se os badalos das vacas, que ali surgem dos recantos e encostas mais inacreditáveis, quase como se fossem cabras, e o céu abriu-se um pouco, de um tecto muito baixo e cor de chumbo para nuvens altas, iluminadas pelo pôr-do-sol. E chegou então aquele género de silêncio que aprendi no Pergulho, e que amo: aquele que pode ser atravessado por um carro ou um cão na noite, pelas conversas em tom baixo e quase reverencial dos poucos que ali permaneciam, ou pelos badalos das vacas, sem jamais ser perturbado. Um silêncio que é atravessado mas não interrompido.
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