quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

Dezembro 2012

Dezembro 2012



A Igreja de Nossa Senhora da Vitória, pequena e íntima
A Baixa como uma seta longa e estreita que se estende diante de mim
A calma clássica e lisboeta da livraria da Assírio & Alvim
Livros novos, embrulhados num papel branco discreto, que me dá gozo trazer na mão
O último andar dos Armazéns, com as janelas altas invocando a Sé,
e o Miradouro de Santa Luzia, e o meu aniversário, num ano passado
A poesia do Tolentino Mendonça sobre a mesa
As luzes de Natal contra o céu de fim de tarde, e a gente na rua
A Vida Portuguesa
E canetas de tinta permanente

Lisboa em Dezembro

Lisboa | Dezembro 2016

Dançar no escuro

Lisboa | Dezembro 2016


Danço sozinha, por dentro, ao descer a Avenida da Liberdade em época de Natal. Danço sozinha, deixei para trás quem pesa, sabendo que espera por mim do outro lado do rio quem me dá calor de aconchego e céus abertos. Danço e canto na minha cabeça porque os dias minguam, mas vem aí a Luz, e porque mesmo os néons frios que agora tentam passar por luzes de Natal não diminuem o calor próprio de Dezembro e dos presépios que já não se vêm na rua mas vivem, cada ano um pouco maiores, na minha sala, em tantas salas, e na capela onde volto sempre como a casa. Danço no meu reflexo que me segue de vitrine em vitrine, onde se notam já as primeiras marcas da idade e do desencanto, mas também a luz de cada recomeço e reencontro. A chegar aos trinta e três, vinda de uma família onde as mulheres envelhecem muito cedo, uso o baton como uma arma porque o encanto não chega, mas olho-me nos olhos e vejo uma centelha que há muitos anos não via. Danço sozinha, por dentro, ao descer a Avenida.

Lisboa em Dezembro

Lisboa | Dezembro 2016

domingo, 20 de novembro de 2016

sexta-feira, 16 de setembro de 2016

Quinze Dias no Japão, de João Bénard da Costa (1979)

"Mas porque, precisamente, estas platónicas noções - as de modelo e cópia - se não inserem na tradição nipónica em que tudo é uma e outra coisa. (...) Este espírito, obediente a um princípio constante na cultura japonesa, tem porventura a sua mais genial expressão no santuário xintoísta de Isé. Pode dizer-se que ele é a mais antiga estrutura do Japão (remonta ao século I a. C.) e a mais recente, pois a que lá vemos foi edificada em 1973. Como? Adiantando sobre o que direi de Isé, no último desta série de artigos, observarei que, ao longo destes quase dois mil anos, o santuário foi invariavelmente destruído de 20 em 20 anos, para que, em face do templo demolido, se reconstruísse um outro, idêntico e imutável. Por forma que seja impossível, pelos nossos critérios historicistas, afirmar se Isé tem seis anos ou dois mil. Como é impossível dizer se o Palácio Imperial de Quioto tem 100 ou 1200 anos, ou se o Pavilhão de Ouro tem 20 ou 600."
"Tudo coexiste em camadas, como parece que sucede, para as eras mais remotas, nos estratos descobertos pelas escavações dos arqueólogos. Só que as camadas se não sobrepõem: entrelaçam-se."


Edição d'O Independente, de uma das típicas colecções de "livros de Verão" dos jornais. Infelizmente tem tantas gralhas e uma edição tão pouco cuidada que chega a dificultar a leitura. Só que nada disso anula o prazer que é ler acerca de um país tão diferente e que ainda hoje nos causa, a nós ocidentais, tantas perplexidades (imagine-se em 1979), num conjunto de textos de temas bem escolhidos, tratados com cuidado e propósito, por uma voz atenta, sensível, culta, de pensamento profundo e límpido como me pareceu ser a de João Bernárd da Costa.

quinta-feira, 15 de setembro de 2016

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

A Memória de Shakespeare e Nove Ensaios Dantescos

"A memória do homem não é uma soma; é uma desordem de possibilidades indefinidas."

"De Quincey afirma que o cérebro do homem é um palimpsesto. Cada nova escrita cobre a escrita anterior e é coberta pela que se segue, mas a memória todo-poderosa pode exumar qualquer imprecisão, por mais momentânea que tenha sido, se lhe derem o estímulo suficiente."

A Memória de Shakespeare, Jorge Luis Borge

terça-feira, 13 de setembro de 2016

Resumo temporário de Maria Gabriela Llansol

Os Cantores de Leitura: um pouco fechado na sua lógica interna, que é bastante hermética, mas bom.

Um Arco Singular (Livro de Horas II): francamente bom. Eu tenho um fascínio grande por diários de escritores, e aqui a lógica interna de que falei antes torna-se mais arejada; beneficia ao ser posta no contexto do quotidiano da escritora, da sua vida interior, e acompanhada no seu desenvolvimento e evolução, ganha sentido e beleza.

Tradução de Les Fleurs du Mal, de Baudelaire: péssima. É um problema difícil, o da tradução da poesia, mas nada justifica a total destruição do ritmo e disposição dos poemas originais. Como poesia original da autora, baseada na obra, poderá ter os seus méritos, mas enquanto tradução é muito má.

Entends, ma chère, entends la douce Nuit qui marche

Sois sage, ô ma Douleur, et tiens-toi plus tranquille.
Tu réclamais le Soir; il descend; le voici:
Une atmosphère obscure enveloppe la ville,
Aux uns portant la paix, aux autres le souci.

Pendant que des mortels la multitude vile,
Sous le fouet du Plaisir, ce bourreau sans merci,
Va cueillir des remords dans la fête servile,
Ma Douleur, donne-moi la main; viens par ici,

Loin d'eux. Vois se pencher les défuntes Années,
Sur les balcons du ciel, en robes surannées;
Surgir du fond des eaux le Regret souriant;

Le soleil moribond s'endormir sous une arche,
Et, comme un long linceul traînant à l'Orient,
Entends, ma chère, entends la douce Nuit qui marche.


Recueillement, Charles Baudelaire

sexta-feira, 2 de setembro de 2016

Beirut, Postcards From Italy

Foglio d'inverno

O doge não me recebeu na grande praça
estava então em combate
num porto longínquo do oriente
que depois se perdeu

Senhor de mim aluguei um quarto
num hotel desconhecido
passei muitos dias
sem falar a ninguém
era uma sombra
e invadia a altas horas
as ruas estreitas do canal

Também me acontecia
adormecer numa gôndola
e em sonhos chegar a lugares
que depois incessantemente buscava
na laguna

Nesse inverno Leonardo
pintava com sucesso
na academia
mas não o procurei

José Tolentino Mendonça

Setembro

quinta-feira, 21 de julho de 2016

Verão

Summer days. Dias como poemas de Sophia.
Summer days. De olhos rentes à água.
Summer days. De olhos rentes à água.
Julho 2016


"Reino de medusas e água lisa
Reino de silêncio luz e pedra
Habitação das formas espantosas
Coluna de sal e círculo de luz
Medida da Balança misteriosa

Verão

Summer days. Dias que são como poemas de Sophia.
Summer days. Dias como poemas de Sophia.
Julho 2016



"É tudo igual a um sonho extremamente lúcido e acordado. Sem dúvida um novo mundo nos pede novas palavras, porém é tão grande o siléncio e tão clara a transparência que eu muda encosto a minha cara na superfície das águas lisas como um chão."

Verão

Summer days. Dias que são como poemas de Sophia.
Summer days. Dias que são como poemas de Sophia.
Julho 2016


"Meio-dia. Um canto da praia sem ninguém.
O sol no alto, fundo, enorme, aberto,
Tornou o céu de todo o deus deserto.
A luz cai implacável como um castigo.
Não há fantasmas nem almas,
E o mar imenso solitário e antigo
Parece bater palmas. "

*

"Dai-me o sol das águas azuis e das esferas
Quando o mundo está cheio de novas esculturas
E as ondas inclinando o colo marram
Como unicórnios brancos."


Dias que são como poemas de Sophia.