Livros de 2025 | Ordens Menores, Agustina Bessa-Luís

“Tudo ali convidava a uma indolência fútil, e não era sem razão que se repetiam os casos de homens passivos, entregues a um trabalho precário e mal remunerado mas que os deixava livres para a improvisação dos sonhos e dos desejos. Homens cultos ou ignorantes tinham a mesma inspiração duma vida senil e gloriosa nos filamentos da história privada. As primeiras letras faziam-nos sonsos e as segundas tornavam-nos indecisos. Valeria o mundo tanto empenhamento e tanto esforço? Parecia que se preparavam para uma batalha, o desarrumar das ilusões que eram sobretudo a mediocridade como luxo do orgulho. Porque não se podia dizer que o insucesso partia da insignificância de meios, fossem eles de inteligência e de fortuna. As casas mais sólidas arruinavam-se pela melancolia dos homens a quem o vício não seduzia a ponto de os conduzir a situações combativas. Havia no português um defeito do gosto, ou então um paradoxo da sua natureza que vinha de muito longe, talvez desde que o sentimento celta se introduziu na sociedade. Detestava qualquer organização, tinha uma cultura afectiva e que se manifestava pela alteração do humor (...). Todo o dia aconteciam coisas, a intriga crescia entre as pessoas e depois explodia em decisões que pareciam absurdas e eram apenas consequências duma lenta convulsão de sentimentos.”

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