«Nos Versículos Satânicos é portanto a arte do romance enquanto tal a incriminada. É por isso que, em toda esta triste história, o mais triste não é o veredicto de Khomeiny (que resulta de uma lógica atroz mas coerente) mas a incapacidade da Europa para defender e explicar (explicar pacientemente a si própria e aos outros) a mais europeia das artes que é a arte do romance, por outras palavras, para explicar e defender a sua própria cultura. Os "filhos do romance" abandonaram a arte que os formou. A Europa, a "sociedade do romance", abandonou-se a si própria.
Não me admira que teólogos da Sorbonne, a polícia ideológica desse século XVI que tantas fogueiras acendeu, tenham feito a vida dura a Rabelais, obrigando-o a fugir e a esconder-se. O que me parece muito mais espantoso e digno de admiração é a protecção que lhe proporcionaram homens poderosos do seu tempo, o cardeal Du Bellay, por exemplo, o cardeal Odet, e sobretudo Francisco I, rei de França. Terão querido defender princípios? A liberdade de expressão? Os direitos do homem? O motivo da sua atitude era melhor; amavam a literatura e as artes.
Não vejo nenhum cardeal Du Bellay, nenhum Francisco I na Europa de hoje.»
Milan Kundera, "No dia em que Panúrgio deixar de fazer rir" em Testamentos Traídos
Não me admira que teólogos da Sorbonne, a polícia ideológica desse século XVI que tantas fogueiras acendeu, tenham feito a vida dura a Rabelais, obrigando-o a fugir e a esconder-se. O que me parece muito mais espantoso e digno de admiração é a protecção que lhe proporcionaram homens poderosos do seu tempo, o cardeal Du Bellay, por exemplo, o cardeal Odet, e sobretudo Francisco I, rei de França. Terão querido defender princípios? A liberdade de expressão? Os direitos do homem? O motivo da sua atitude era melhor; amavam a literatura e as artes.
Não vejo nenhum cardeal Du Bellay, nenhum Francisco I na Europa de hoje.»
Milan Kundera, "No dia em que Panúrgio deixar de fazer rir" em Testamentos Traídos
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